terça-feira, 24 de maio de 2011

REFLEXÕES DE UMA MULHER INVISÍVEL

Amigos,

Aqui em Conservatória, faço parte de um grupo de amigos  , que   com o passar do tempo   foi  se consolidando.  Hoje -  sem  nenhuma cerimônia  -  afinal  o tempo já tornou sólida nossa intimidade ,  conversamos sobre tudo… Para variar, somos em número  maior de mulheres, e pouquíssimos homens, que são   -  concluo -   ótimos “ouvidos” e muito pacientes.   Um deles é meu marido,   e  o outro,  também marido de uma das integrantes do grupo.

No final da semana passado, nossa amiga  REGINA DOLL, levantou um tema interessante.  Durante uma conversa onde elogiávamos o fato da mesma estar muito bonita e elegante,  Regina,  com seus lindos olhos azuis,  falou: Virei uma mulher invisível… (os olhos de Regina falam…)  

Conversamos longamente  sobre  a enfática frase,  quando uma das integrantes da mesa ,   propôs que nossa amiga Regina,      escrevesse  alguma coisa sobre essa intrigante posição de Mulher Invisível.  Então  abaixo, o texto “cirúrgico” de Regina Doll.

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Reflexões de uma Mulher Invisível

Cópia de Queijos e Vinhos em 25-26-06-2010 - Jogo Brasil 0x0 Portugal 036 

Regina Doll

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Conversa de bar pode ser muito estimulante. É o que acontece quando reunimos nossa turma nas noites de Conservatória, pequena vila do sul-fluminense, que faz parte do circuito do Vale do Café e é conhecida, principalmente, por suas serenatas.

Somos um grupo de cerca de quinze pessoas, de ambos os sexos (as mulheres predominam), todos baby boomers, nascidos no pós-guerra. Aos finais de semana, nas ruas da cidade, onde alguns moram e outros têm casas de campo, a música rola solta e o papo também. É um pessoal de alto nível, gente bem sucedida e inteligente, que vai para a night para se divertir e se encontrar, quase todos na faixa dos sessenta anos, ou próximos a ela. Inevitável que a conversa gire em torno da vida de cada um, dos amores presentes ou ausentes e das crises existenciais de quem já chegou nesta etapa em que se é velho para ser moço, mas, ainda se é moço para ser velho. Andam dizendo que “os sessenta são os novos quarenta” e que devemos nos comportar de acordo. Tentamos seguir à risca este preceito, embora às vezes, o corpo nos traia, com uma nova ruga que não estava ali na semana passada, uma dor lombar que parece que surgiu do nada ao acordarmos ou a mudança do grau dos óculos de leitura. Nem vamos falar da taxa do açúcar, do colesterol ou da pressão alta. Nosso pessoal é bem saudável. Muitos bebem, alguns fumam, outros se exercitam com razoável regularidade. Mas, a verdade é que nenhum de nós estava preparado para enfrentar os novos desafios do gradual e inevitável envelhecimento.

Foi a nossa geração que aboliu o tabu da virgindade, viu surgir a pílula anticoncepcional, foi às ruas pedir “paz e amor” – fomos todos hipies, mesmo os que não o eram de forma radical – liberamos a mulher de seu papel tradicional de mãe e dona de casa, casamos, nos divorciamos, voltamos a nos casar e, novamente, a nos separar. Mudamos o mundo de nossos pais, seus conceitos e sua ideologia. Fomos verdadeiramente revolucionários em nosso tempo. Vimos surgir a contracultura, o movimento underground, absorvemos galhardamente a imensa transformação produzida pela internet e vimos nossa expectativa de vida aumentar consideravelmente através dos avanços tecnológicos e farmacêuticos. Mas, por outro lado, agora começamos a encarar uma nova realidade: o que fazermos com estes anos de vida excedentes que recebemos junto com todo o pacote da modernidade?

Nossos questionamentos internos, nossas angústias, a questão da solidão, da busca da felicidade – independentemente da idade cronológica que se tenha – a procura do amor e do sexo, a tentativa de manter uma boa aparência em uma idade não valorizada nem pela sociedade, nem pela mídia, em um país onde a juventude e a perfeição física são tão importantes, quase que obrigatórias, são, muitas vezes, os temas de nossas conversas nas noites de Conservatória.

Estes assuntos, geralmente discutidos pelas mulheres e acompanhados, atentamente, pelos homens presentes, exigem reflexão e coragem. Afinal, confrontar inseguranças, medos e dores da alma não é tarefa amena. Mas, geralmente, o papo vai pela noite adentro, até a madrugada. Como é normal, existem no grupo várias mulheres sozinhas – separadas ou solteiras – todas ainda bonitas e bem conservadas, apesar de sexagenárias, (que palavra horrível, meu Deus!) muitas ainda trabalhando, outras empreendedoras, donas de seus próprios negócios. Mas, de uma forma geral, nenhuma delas, a não ser as casadas há muito tempo, já avós, têm um companheiro. E por companheiro, entenda-se, não um provedor. São todas financeiramente independentes e bem resolvidas nesta área. O que lhes falta não é um marido e sim um parceiro, no que esta palavra tem de mais integral – um outro ser humano com quem possam conversar sobre tudo, rir e chorar, abraçar e serem abraçadas, acariciar e amar. O sexo fácil e descompromissado da juventude – ótimo à época – já não é mais satisfatório. Hoje, o gesto aparentemente menos espetacular de um afago, de uma palavra, de um olhar, a intimidade de corpos já não tão moços e perfeitos, mas ainda dignos de serem tocados e amados conta mais. Este companheiro, este amigo, este cúmplice, este colo, onde andará?

Sou uma dessas mulheres, separada e sem filhos, estas mulheres que vivem “no limbo”, como diz uma inteligente ex-jornalista amiga minha. Eu, porém, me defino, como a “mulher invisível”. Ainda com uma aparência agradável, vida financeira resolvida e boa bagagem cultural, aos sessenta anos, o que fazer? Cair na armadilha emocional de um “garotão”, que ainda me acha uma “coroa traçável” e bem sucedida, que poderá lhe proporcionar uma vida de conforto? Ou procurar um homem da minha idade, ou mais velho, geralmente egresso de dois ou três casamentos falidos, o último deles com um brotinho, a esposa-troféu, que lhe dilapidou as forças e a grana e com quem ele tem um filho pequeno que precisa ainda de um pai, quando o sujeito está mais é para avô? Definitivamente não. Mas, como fica a vida de um ser humano privada de carinho, de aconchego, do toque de mãos amorosas? A procura não é por sexo selvagem e desenfreado, por paixão avassaladora, por arroubos juvenis de ciúme e posse. Isto, em época própria, já experimentei. Privadas do papel de mãe e, conseqüentemente de avó e deixando de sermos desejável por causa do errôneo conceito de que só quem é belo e moço merece ser amado estará destinada a mim e às outras companheiras apenas a contemplação da vida em branco, por ainda longos anos? Uma dádiva têm sido os amigos. A leitura é outra grata companheira. Mas, continuam faltando o gesto, o olhar, a ternura, a pele contra a pele, as confidências que a gente só faz ao parceiro. Em nossa sociedade, uma mulher que não é mais jovem e cujo esplendor dos primeiros anos já desapareceu, não tem mais função alguma. É, sim, uma mulher invisível. Eu ,sou apenas mais uma entre tantas. Mas, será mesmo que preciso “de um homem para chamar de meu?” E, neste caso, como vencer os temores, inseguranças e preconceitos de nossa condição?

Regina Doll

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Aff!  Este texto é para reflexão mesmo, e tenho certeza que muitas conversas sobre o tema, vão embalar nossas noites em Conservatória:  como sempre entremeando  boas risadas!!!

Invisíveis, porém com um humor maravilhoso!

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Abraço fraterno,

CHRISTINA ANTUNES FREITAS 

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